Faça aqui a sua pesquisa...

Porque não são as vacinas 100% eficazes?

O nível de eficácia das vacinas contra a Covid-19 fez surgir a dúvida: existem vacinas 100% eficazes contra outras infeções? Se não, porquê?

9 Set, 2021
6 min de leitura

É comum ouvir-se, em relação a qualquer vacina, que uma eficácia completa é praticamente impossível. Mas por que motivo não são as vacinas 100% eficazes? Mais do que olhar para as próprias vacinas, a resposta está em cada um de nós.

As vacinas têm, na sua maioria, elevados níveis de eficácia e também de efetividade (falaremos disto mais abaixo), estabelecida a partir do impacto real na proteção da população. A vacina contra a Covid-19 da Pfizer-BioNTech, a primeira autorizada na União Europeia, mostrou uma eficácia de 95% nos ensaios clínicos. A da Hepatite A ultrapassa os 95%, assim como a da poliomielite (depois de três doses). Duas doses da vacina contra o sarampo protegem cerca de 93% da população. Mas a vacina perfeita, 100% eficaz, simplesmente não existe – nem poderia, provavelmente, existir.

 

Vacinas 100% eficazes não são uma realidade porque a resposta imunitária gerada no organismo varia de pessoa para pessoa, sendo muito forte e duradoura nalguns casos e muito fraca noutros. As causas podem ser diversas e incluem, nomeadamente, fatores genéticos, presença de algumas patologias ou hábitos de vida, entre outros fatores.

 

Recordemos como funcionam as vacinas: são constituídas por substâncias que ajudam a gerar imunidade ao simular a presença de um agente estranho específico no nosso organismo e ensinando o sistema imunitário a reconhecer, identificar e lutar contra essa infeção. Deste modo, é gerada uma resposta imune protetora sem os riscos de uma infeção real. Contudo, a dimensão e a qualidade dessa resposta não são sempre iguais. Nalguns casos, o sistema imunitário não gera uma resposta eficaz, o que faz com que a proteção contra a doença não seja tão robusta quanto o esperado.

 

Por comparação, pensemos nas vacinas como uma armadura que nos protege contra determinadas doenças infeciosas. Tal como uma armadura de tamanho único, as vacinas vão servir melhor (e, portanto, proteger) algumas pessoas e menos outras. Ou seja, em certos indivíduos – no geral, entre a população mais idosa e imunodeprimidos –, as vacinas são menos eficazes.

Vacinas 100% eficazes? O que significam as percentagens?

Para falarmos do nível de proteção conferida por uma vacina, é também importante olharmos para o que significam, exatamente, as percentagens de eficácia.

 

Imaginemos, por exemplo, uma vacina com 90% de eficácia. Tal não quer dizer que vá ‘fazer efeito’ – ou seja, gerar uma forte resposta imunitária e proteger contra a doença em infeções futuras – apenas durante 90% do tempo. Estes 90% de eficácia significam que, numa população totalmente vacinada, 90% das pessoas não vão desenvolver a doença se estiverem em contacto com o agente infetante. Para além disso, e de um modo geral, estas percentagens sobem quando se trata de prevenir formas graves (hospitalização) e mortes causadas por doenças infeciosas.

 

A percentagem de eficácia é definida nos ensaios clínicos de cada vacina, sendo calculada tendo em conta o número de pessoas que desenvolveram a doença depois de vacinadas, quando comparadas com um grupo de controlo (que recebeu um placebo).

 

No entanto, por mais diverso e representativo que seja o grupo de voluntários vacinados em ensaios clínicos antes da introdução no mercado, este não espelha de modo perfeito toda a heterogeneidade da população-alvo. Isto significa que o nível de eficácia pode revelar-se diferente quando a vacina começa a ser administrada à população, em larga escala, sob condições reais. Também por isso, a eficácia de uma vacina não pode ser o único fator a pesar na sua avaliação.

Eficácia e efetividade

A efetividade das vacinas contra a Covid-19 na Europa ronda em média, atualmente, os 89%, com o esquema de vacinação completo (dados preliminares I-MOVE-COVID-19).

Como referido, a eficácia das vacinas é estabelecida em ensaios clínicos, comparando voluntários que receberam a vacina e voluntários que receberam um placebo.

 

Mas o que acontece quando as vacinas saem do laboratório e começam a ser usadas em larga escala? Aí começamos a poder ter uma noção mais precisa sobre a efetividade de uma vacina – ou seja, o seu impacto no mundo real. É possível aferir a efetividade de uma vacina ao perceber o nível de redução de casos de uma determinada doença numa determinada população.

 

Porque é que a eficácia e a efetividade de uma vacina podem não ser exatamente as mesmas? Sobretudo porque as condições em ambiente de ensaio clínico, com um número mais limitado de pessoas, e em ambiente real não são exatamente as mesmas. Só a administração em larga escala, na população, pode responder com maior precisão a vários aspetos do funcionamento de uma vacina. Um enviesamento em termos da idade dos voluntários, fatores biológicos, geográficos e/ou culturais e até diferentes hábitos comportamentais e estilos de vida podem resultar em diferentes níveis de eficácia e efetividade.

 

Apesar de não existirem vacinas 100% eficazes ou efetivas, a maioria delas confere uma proteção muito elevada contra doenças infeciosas, evitando sobretudo formas graves da doença – mesmo que possa não bloquear completamente a infeção e a transmissão. Daí que, na proteção individual e no controlo das doenças infeciosas na comunidade, a vacinação seja uma estratégia altamente eficaz.

 

É crucial, no entanto, ter em conta mais um fator: a duração da imunidade conferida pelas vacinas. Mesmo quando a vacina é eficaz, gerando a resposta imunitária esperada, a proteção pode desvanecer-se com o tempo, o que leva à necessidade de doses de reforço. A duração da imunidade conferida varia de vacina para vacina, sendo que, nas vacinas mais recentes contra a Covid-19, é um tema ainda em avaliação.

 

A título de exemplo, a vacina do sarampo pode conferir imunidade para toda a vida (depois das duas doses recomendadas), enquanto a imunidade conferida pela vacina da difteria é estimada em 10 anos (daí a necessidade de reforços ao longo de toda a vida adulta).